sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Tudo o que Faço ou Medito - Fernando Pessoa

Esta tem sido uma semana de ponderação, até mais que reflexão e aqui agradeço a este grande ser Fernando Pessoa, por expressar de uma forma tão bela uma das minhas brilhantes conclusões.

Tudo o que Faço e Medito

Tudo que faço ou medito
Fica sempre na metade.
Querendo, quero o infinito.
Fazendo, nada é verdade.

Que nojo de mim me fica
Ao olhar para o que faço!
Minha alma é lúcida e rica,
E eu sou um mar de sargaço –

Um mar onde bóiam lentos
Fragmentos de um mar de além...
Vontades ou pensamentos?
Não o sei e sei-o bem.

Fernando Pessoa
www.astormentas.com

Triste de Quem Vive em Casa - Fernando Pessoa

Triste de quem vive em casa



Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa,
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!


Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz-
Ter por vida a sepultura.
...

Grécia, Roma, Cristandade,
Europa - os quatro se vão
Para onde vai toda idade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião?


Fernando Pessoa

sexta-feira, fevereiro 06, 2009

Sentada à beira da Estrada

A caminhada está iniciada, resta saber a forma como vamos percorrer o caminho. Será que o vamos sentir nos pés, será que o vamos sentir nas mãos, será que o vamos sentir como uma brisa nos cabelos? Será que o vamos deixar de sentir. E mesmo que o façamos, será o suficiente para não percorrermos o caminho. Muitos de nós estão pesados, têm malas e malas, alguns trazem baús e outros usam veículos para carregar tanta coisa que vão precisar quando chegarem ao destino. Provavelmente, alguns vão querer ficar sentados, mesmo que seja no meio do caminho, afinal até aqui tem sido uma montanha-russa de pisos, pavimentos e escolhas, e a carga é pesada, o corpo dói e o sonho foge. Outros já antevêem o destino, outros sabem que tal coisa não existe e o que conta é a viagem. Eu creio que pertenço a este último grupo, ainda tenho uma mala ou duas, mas cada vez mais olho menos para elas, ainda as arrasto mas coloquei-lhes umas rodinhas, parecem mais leves, só que ainda pesam. Caminho e o chão é sentido nos pés, não com desconforto, mas com a certeza que tenho corpo e que posso ir fazendo o caminho, sinto a brisa nos cabelos, sinto porque estou atenta, afinal é uma brisa. Faço o caminho pela viagem e aprecio cada momento, uma vez ou outra sento-me à beira da estrada principal, observo os meus companheiros, saúdo-os e desejo-lhes força e alegria, elogio a coragem dos que experimentam atalhos, azinhagas e até desbravam novos trilhos.
Neste momento, estou parada na beira da estrada, olho os meus irmãos, vejo a estrada e observo os novos trilhos, estou a decidir o que fazer, abri uma mala e olho para o conteúdo, penso se ainda tenho que transportar estas coisas, penso se o que elas significam não existe e vive em mim, será que ainda preciso destas coisas para me lembrar, para amar…olho um velho caderno de apontamentos, abro em busca de um significado, de uma resposta. O que encontro faz-me sorrir, fala de uma oposição do senhor Saturno ao arrojado Úrano e como apontamento coloquei de lado a anotação: “O que não tem consistência é abandonado”. Faz-me sorrir e começar a decidir….